1. O que é um plano de desenvolvimento pessoal e profissional? E qual a sua importância para uma organização?
É uma ferramenta estratégica e prática dentro de um sistema de gestão de pessoas para trabalhar o desenvolvimento de cada profissional dentro da organização e que é alimentada por diferentes canais e indicadores (desempenho, feedback, motivações etc.). Esta ferramenta tem por sua vez um objetivo concreto de melhoria contínua numa lógica construtiva, no sentido de fazer com que a pessoa se sinta alinhada com a organização.
Esta melhoria é sempre diagnosticada tendo por base a importância da sua evolução concreta e pode envolver o grau de competências, o nível formativo numa vertente profissional ou académica, e ainda o desenvolvimento de um potencial específico para determinada área.
2. Este plano é um processo recente? Como é que está a ser adoptado nas organizações?
Atualmente tem uma prevalência muito maior porque mudou a forma como as organizações olham para as pessoas. As pessoas passaram a ter um papel central na organização, onde se tenta cada vez mais humanizar o processo da sua gestão bem como as próprias organizações.
Por outro lado, as pessoas passaram a ter uma voz mais ativa no contexto da sua própria gestão pessoal de carreira, na medida em que os respectivos modelos também evoluíram e hoje há uma escuta mais profunda e detalhada relativamente às suas opiniões.
3. Que ferramentas existem para garantir que as Pessoas sejam ouvidas de forma consistente?
É um ponto muito relevante. Para se ouvirem as pessoas têm que ser criados espaços e momentos que levem a que esta circunstância possa acontecer. Mas acima de tudo é fundamental criar uma cultura organizacional que tenha como substrato ouvir e considerar as pessoas.
Esta realidade não pode ser aplicada friamente já que se baseia nos valores da organização e na preocupação genuína desta com as pessoas. Este fluxo deve ocorrer no dia-a-dia, gerando um feedback contínuo e não apenas de forma sazonal, sem prejuízo dos momentos formais de avaliação.
A intencionalidade traz significado aquilo que é feito diariamente. Se as pessoas executam tarefas rotineiras ficam à mercê da monotonia, mas se existir um significado em cada tarefa, é muito provável haver maior motivação.
4. De que forma deve ser feito um sistema de incentivos?
De forma pessoal e não padronizada porque as motivações são intrínsecas. As motivações diárias são distintas entre as pessoas. Sem prejuízo de haver uma base transversal com um conjunto de ofertas que geram valor ou bem estar no dia-a-dia, tem também de existir um cuidado individual, respeitando a singularidade de cada pessoa.
É importante que este processo seja visto como uma cultura e não propriamente como uma ferramenta, no sentido de quebrar a ideia que tem existido ao longo dos últimos anos centrada nos “elementos de alto potencial” , porque todas as pessoas têm um papel relevante dentro da organização.
Quando falamos de cultura não estamos a falar de um programa dirigido apenas aos elementos de alto potencial mas sim para todas as pessoas, independentemente do quadrante que ocupam na matriz de talento daquela organização.
5. Como é que o potencial das pessoas é trabalhado de forma positiva?
Através da promoção de um processo de auto-conhecimento e de auto-descoberta por parte do colaborador, que pode até surpreender o próprio bem como a organização. Existem pessoas que se revelam serem excelentes líderes quando sujeitas a oportunidades concretas, embora algo as tenha convencido do contrário.
Por vezes há um fenómeno de rotulagem que precisa de ser testado: as pessoas quando chegam às empresas ficam “reféns” de uma primeira impressão, através da qual é criada uma expectativa que pode influenciar todas as suas ações, por isso é relevante o processo ser contínuo para ver as pessoas serem capazes de se transformar – “Eu hoje sou isto mas amanhã sou completamente diferente”.
6. Em que ponto é que se situa a relação entre as pessoas e as organizações sobre o tema da saúde mental?
Vários estudos têm noticiado o impacto da saúde mental na produtividade das pessoas e das organizações. Houve um impacto negativo da pandemia, mas também aspectos positivos como uma maior sensibilidade para o tema.
Percebe-se que este tema deixou de ser um estigma, dando lugar a uma maior relevância da sua causa para a saúde das pessoas e para o papel da organização na promoção de ambientes saudáveis de trabalho. As próprias pessoas também passaram a ter uma função importante em interpretar toda esta realidade e acreditar positivamente nesta dinâmica.
7. As pessoas estão mais determinadas em viver a sua vida num equilíbrio mais sustentado?
Fala-se muito em work-life balance, mas este conceito deve focar-se essencialmente em life balance. Efetivamente as pessoas começam a olhar de um modo mais holístico para si próprias e de forma integrada na sua dimensão pessoal, na qual é fundamental ver o trabalho como uma parte integrante e gratificante da vida.
É importante garantir nas tais “semanas de 4 dias” – onde parece existir um foco excessivo na eficiência máxima – que todo o esforço feito em processos de team building e de promoção do relacionamento intra e inter equipas não se perca neste sistema.
Uma empresa que queira promover uma cultura de work-life balance não pode olhar para isto de forma padronizada sem atender à singularidade de cada pessoa nas diferentes equipas.
8. O que mudou nos modelos de gestão de carreira?
Verificou-se uma mudança significativa porque os modelos antigos eram demasiado fechados, lineares e com pouca flexibilidade no seu critério: sem meritocracia e baseados na antiguidade num determinado cargo e não pelas competências desenvolvidas e naquilo que estas entregam à organização.
Hoje existem modelos que permitem respeitar a cultura matricial da organização com maior mobilidade através de vários caminhos, onde as pessoas podem evoluir de diferentes formas: no perfil técnico, de liderança ou de gestão (ou ainda misto).
Um dos principais fatores críticos de sucesso é a competência de liderança nas chefias intermédias porque estas são posições claramente influenciadoras. Por outro lado, as pessoas têm dificuldade em conhecer as suas competências (habituaram-se a elencar um conjunto de competências que o mercado valoriza) mas não sabem evidenciar onde são competentes, por exemplo, através de histórias que se tornam parte da cultura das organizações.
9. Como é que as empresas de menor dimensão podem implementar estes modelos?
É importante terem algumas bases sólidas e recorrer a outsourcing que ajudem estas empresas a serem mais dinâmicas no tema, e sobretudo a acederem ao conhecimento e às ferramentas e processos, adaptando-os à realidade específica de cada empresa para criar bons princípios e boas práticas na gestão de pessoas.
Esta realidade é progressiva, levando a empresa a adoptar novas ferramentas à medida das suas necessidades e crescimento.
10. Que tendências existem e que conselhos práticos?
A aposta na individualidade tem sido uma tendência nesta área. Embora implique mais investimento de tempo no início permite antecipar ganhos futuros nas pessoas, que se tornarão mais autónomas, satisfeitas, motivadas e auto-determinadas.
O objetivo das várias abordagens faladas ao longo desta conversa não é instrumentalizar, nem colocar as pessoas “dentro de um sistema” ou “aprisionando-as” a um conjunto de regras, mas melhorar as condições de vida e de trabalho, atendendo à qualidade no dia-a-dia, às motivações de cada pessoa e ao ambiente laboral, consolidando a cultura da organização.
As ferramentas evoluem mas a mentalidade por vezes fica inalterável. É fundamental que as organizações evoluam na sua mentalidade e os próprios agentes da mudança também, percebendo o papel da psicologia nas organizações.
Qualquer organização que queira evoluir deve ver a ferramenta e o processo como estando ao seu serviço e nunca o contrário – trabalhar as ferramentas de hoje com a mentalidade de amanhã.